quinta-feira, 24 de fevereiro de 2022

Cap. 9 - Final - Ecce Homo - Louis Claude de Saint Martin

Do livro Ecce Homo por Louis Claude de Saint Martin, publicado pela Sociedade das Ciências Antigas






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 Capítulo IX

Vós homens de paz, homens de desejo, não vos desencorajeis. Ainda existem entre os ministros do nosso Deus, homens que seguem tanto o caminho dos verdadeiros profetas, quanto a santa caridade do nosso mestre e as iluminações de seus discípulos.

Uni vosso destino a esses homens eleitos que responderam fielmente à sua eleição, consistindo nisso sua beatitude. Eles vos conduzirão pelos humildes caminhos de Ecce Homo, em direção à regeneração, que é o objetivo do vosso destino de origem.

Longe de conduzir-vos por caminhos de despotismo e tirania, vos dirão que todos temos um cordeiro por mestre e que só nos tornando cordeiros como ele, o mestre nos reconhecerá como seus discípulos e irmãos.

Longe de cavar precipícios de trevas e ignorância diante de vós, esses homens eleitos vos dirão que a alma do homem é feita para abraçar todas as obras geradas pela origem das coisas desde seu seio. 

Pois, se é verdade que o homem deve ser o testemunho universal de Deus, como poderia se identificar com tal papel sem ter o conhecimento e a visão dos fatos sobre os quais deve depor?

Longe de vos deixar adormecer numa letargia funesta, e de apresentar vosso alto destino como uma empresa fácil de ser cumprida, eles vos mostrarão que podeis ser testemunhos de Deus, quando sereis veraz e confirmados na justiça. Citarão, por exemplo, os tribunais humanos em que as testemunhas devem jurar dizer a verdade, e onde, acima de tudo, não se recebem pessoas difamadas; instrução simples mas profunda, que pode ampliar vossa visão seja sobre vossa natureza primitiva, seja sobre a qualidade de vossos deveres.

Longe de vos delinear a regeneração do homem como algo fácil de alcançar, vos dirão que só obtereis essa regeneração se vosso espírito for alimentado diariamente com o pão da aflição - como os israelitas comiam o pão ázimo na preparação de suas solenidades, e como ensina a seguinte recomendação dirigida aos primeiros cristãos na carta aos Coríntios, I Coríntios (11:26): Todas as vezes que comerdes este pão e beberdes este cálice, anunciareis a morte do Senhor, até que ele venha.

Lembrarão ainda que no vosso íntimo mais profundo existe um homem exterior bem mais perigoso e difícil de derrotar que o homem material. Vos dirão que procedereis no caminho da regeneração somente quando sentirdes desprezo contra esse homem exterior, ao invés de murmurar contra vossos semelhantes.

É necessário expor agora uma nova verdade útil e fundamental. Se os homens analisassem sua própria conduta e os murmúrios que dirigem uns aos outros, não exprimiriam mais nenhuma repreensão contra seus semelhantes, que estariam isentos de culpa. De fato, quem nunca cometeu a imprudência de censurar as pessoas que o circundam? E quem pode dizer que essa imprudência não seja a verdadeira fonte das faltas dos que se lamentam e das injustiças que são recebidas? De resto, quem de nós, colocado frente a si mesmo, se considera irrepreensível sob todos os aspectos? Quem atingiu a medida dos dons que lhes foram concedidos e dos deveres que lhes foram impostos, para poder superar todos os obstáculos e, assim, manifestar as virtudes divinas? Quem está tão ligado ao Senhor a ponto de operar na qualidade de seu justo e potente instrumento? Se ainda não alcançamos esse ponto, não devemos censurar aos outros por estarem privados de qualidades, pois nosso dever seria preencher suas deficiências por meio do desenvolvimento de todas as faculdades do nosso ser.

Além disso, se a negligência e a cobiça se tornaram o fundamento dos atos da nossa conduta, devemos imputar a nós mesmos as conseqüências desses atos. Esses males são praticamente universais e, ao invés de declamarmos contra as injustiças, incoerências e ações desagradáveis dos nossos semelhantes, deveríamos bater diariamente no peito, pedir reciprocamente perdão e confessarmos uns aos outros, publicamente, que a causa de todos os erros lamentados por nós, só pode ser atribuída a nós mesmos. Para retornar à ordem da justiça e da verdade, cada palavra de qualquer componente do gênero humano deveria ser sempre uma contínua confissão geral. 

Confessai os vossos pecados uns aos outros, dizia Tiago (5:16).

Longe de querer submeter-vos à sua opinião, os verdadeiros ministros de Deus - que ainda existem -procederão sempre no sentido de permitir brilhar a única chama que nos deve guiar. Tomarão, por exemplo, o príncipe dos apóstolos para expressar o que foi dito ao Reparador na montanha santa: 

este é meu filho bem amado em quem pus minha afeição, escutai-o; não queria que nos baseássemos somente nas instruções que ele comunicava, e não temia ao acrescentar: Assim demos maior crédito ainda à palavra dos profetas, a quem fazeis muito bem em entender, como a uma lâmpada que resplandece nas trevas até despontar o dia e surgir a estrela da manhã em vossos corações. Pois, antes de tudo, deveis saber que nenhuma profecia da Escritura é de interpretação pessoal.... ( 2ªep. De Pedro 1:19-20 ).

Assim, os instrutores vos colocarão em guarda contra todas as manifestações em que agentes particulares se apresentam como necessários para a salvação das almas e a renovação da Terra. 

Dessa forma, permanece oculto o vulto do único agente que devemos seguir, aquele que consumou em si mesmo todas as coisas pois todas as profecias sobre regeneração foram expressas em Jesus Cristo, e portanto, não resta outra coisa a cumprir se não as profecias sobre o juízo isto é recompensa e condenação.

Longe de prometer-vos uma paz segura após vossa liberação carnal, os homens eleitos vos chamarão a esse juízo e vos dirão: se não haveis testemunhado a favor da origem humana ou da sua primeira revelação – que iluminou os seres perdidos mais divinamente do que as revelações da natureza e do espírito – sereis obrigados a dar outros testemunhos em favor de todos os vínculos que o amor e a misericórdia fizeram sobreviver (pois mesmo depois do antigo pecado, é vosso dever oferecer a tradução fiel daquele texto original que não haveis lido mais).

Eles vos dirão que sereis julgados com base naquelas primeiras relações com a Divindade; embora as sucessivas alianças possuam também seus testemunhos, e o objeto desses testemunhos é a punição de todos que são legitimamente culpados.

Eis porque a aparição de Moisés e Elias reveste de grande importância e aumenta o peso da condenação dos judeus. Esses dois profetas depuseram sobre dois fatos de que foram testemunhas oculares. Em primeiro, Moisés, pela publicação da Lei e pela promessa do povo de adequar-se a essa. Elias, pela prevaricação do povo infiel e pelos favores distribuídos por parte do céu em favor desse mesmo povo no momento do desespero.

No final dos tempos, esses dois profetas retornarão e estarão ao lado do grande Juiz. De lá trarão seu duplo testemunho: a promulgação da primeira e da segunda Lei, ou das duas alianças, e o abuso que os homens fizeram delas. Ora, como poderão os judeus e todos os outros homens resistir ao duplo testemunho desses dois profetas?

Além disso, os homens terão contra si os testemunhos de todas as manifestações da natureza de que não usufruíram, e que mostram sensivelmente aos homens as maravilhas emanadas do magnífico manifestar-se da vida. Terão contra si as abundantes messes que as Sagradas Escrituras fizeram germinar no ânimo dos justos que as escutaram, analisaram e seguiram. De fato, as Escrituras são uma santa semente que Deus colocou na terra dos homens, ou seja, em suas almas das quais a Sabedoria espera a cada dia a colheita para nitrir-se. Pois a fome dessa Sabedoria aumenta proporcionalmente à privação que a negligência dos homens a fez sofrer. No momento do juízo final, ela rejeitará aqueles que não souberam sustentá-la, opondo a eles o testemunho da colheita que a alma dos justos lhe ofereceu.

Além disso, os homens terão contra si os testemunhos das próprias injustiças de suas colheitas compostas de ilusão e mentira. Assim, tudo que deveria sustentá-los servirá também para condená-los, seja o que procede do próprio homem ou o que virá da natureza, seja o que virá das duas alianças ou o que será o fruto da colheita dos justos.

Não existe nenhum homem, em particular, a quem não possamos dirigir essas terríveis verdades, pois não existe nenhum homem onde essas verdades não possam se realizar.

Portanto, homens imprudentes e displicentes, despertai, tremei e orai para não serem surpreendidos pelo depoimento de tantas testemunhas, assim como das justas reclamações da Sabedoria no momento da colheita. Porque sobre vós ressoará, então, aquele terrível significado de Ecce Homo, e não será mais para abrir-vos a porta da penitência. Essa porta já foi aberta por aquele que veio para vos conferir esse nome. Nome que será pronunciado para comprimir-vos sob um severo juízo na profundidade do abismo.

Se não existe um homem onde possam se realizar essas importantes verdades, convencei-vos portanto – homens de paz, homens de desejo - que cada indivíduo nasceu para ser testemunha de todas as outras obras realizadas pela Sabedoria eterna em favor daquele estimado ser que é sua imagem. Convencei-vos que cada um deveria oferecer um testemunho ativo dos dons e dos favores que essa Sabedoria derrama continuamente sobre a Terra; todos nós deveremos depor, ativa e concretamente, em favor de todas as alianças que Deus contraiu conosco desde a origem das coisas; não devemos protelar em cumprir uma obrigação tão importante. Pelo contrário, devemos temer sair desse mundo antes de termos sido realmente testemunhas dos pactos supremos que esperam nosso depoimento e testemunho efetivo. Devemos temer por não haver satisfeito as condições como podíamos, antes de comparecer a esse tribunal superior, onde se efetua uma relação fiel de todos os testemunhos que foram prestados à eterna generosidade do nosso Deus. Não deixemos de considerar que quando descemos do nosso lugar sublime, arrastamos tudo conosco em nossa funesta e ilusória aparência; consequentemente, estamos sempre em condição de reencontrar tudo se entramos nos caminhos que se seguiram a nossa queda e que não cessam de colocar-se a nossa frente. Não bastaria ao homem Reparador ter trazido para nós o título humilhante de Ecce Homo. 

Não seriam suficientes todos aqueles tesouros de iluminações e valores que ele abriu para os homens com seus ensinamentos e seu exemplo. Ele teria realizado somente metade do seu escopo - nossa regeneração - se houvesse agido somente sobre a superfície terrestre onde habitamos, e nos laços de forma material.

Mas após ter permitido o sacrifício dessa forma, que é o verdadeiro sinal da nossa prevaricação, e o invólucro do Adão prevaricador, subiu às regiões superiores circundado por uma forma pura; quando confirmou-se a escolha dos apóstolos, no seio daquela forma tão santificada, e lhes foi dado o encargo de acalmar suas ovelhas e difundir a boa nova; quando, enfim, foi enviado do alto do seu trono celeste o Espírito Santo para ensiná-los sobre todas as coisas; e quando se verificou essa pregação por intermédio do dom das línguas, não faltava mais nada ao quadro da história universal da humanidade que o divino Reparador não pudesse expor aos nossos olhos.

Homens, meus irmãos que podeis ler nesse Reparador a história universal do homem, qual agente pode vos ensinar outra coisa? Onde podeis alcançar outros ensinamentos que não tenham sido apresentados por essa fonte? Depois de haver mostrado em sua pessoa a rigorosa condenação que nos obriga a portar, desonrada mas humildemente, o título de Ecce Homo, o Reparador finalmente pôde concluir sua obra por inteiro. Ele nos mostrou como, seguindo suas pegadas e os caminhos que nos abriu, podemos estar seguros de ascender novamente em direção às regiões da luz; nesse dia, à nossa chegada nos planos superiores, poderá se dizer de nós gloriosamente aquilo que se disse na nossa origem: Ecce Homo. Eis o homem, eis a imagem e semelhança de nosso Deus, eis o sinal e o testemunho do princípio eterno dos seres, eis a manifestação vivente do axioma universal !

FIM

 

Fonte: Sociedade das Ciências Antigas



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