sexta-feira, 27 de janeiro de 2023

Imposto é roubo, estado é quadrilha, e outras considerações - 2

O que Weber, Olson e outros intelectuais nos ensinam é que a origem do poder político está na associação de indivíduos em comunidade, que necessitam criar uma estrutura administrativa capaz de proteger toda a sociedade de ameaças internas e externas, além de fornecer um sistema capaz de resolver conflitos por meio da justiça. Os impostos fazem parte da estrutura de manutenção dessa ordem — e, como seu pagamento é garantido por lei, o governo pode, em última instância, valer-se da coerção física para assegurar o respeito a essa obrigação.

A hipótese de que o poder político surgiu da livre associação de indivíduos pode ser refutada tanto logicamente quanto empiricamente.

Tomemos a definição de poder político. Conforme nos explica o sociólogo e cientista político Franz Oppenheimer, existem duas maneiras opostas de conseguir riqueza: o meio econômico e o meio político. O primeiro consiste nas trocas voluntárias, portanto na livre e pacífica associação de indivíduos. O segundo consiste na coerção. A política é a obscura arte de se manter em uma posição institucionalizada de parasitismo coercivo, e o poder político nada mais é do que essa própria posição. Portanto, a afirmação de que o poder político é oriundo do meio econômico é autocontraditória.

Um oximoro ocorre também quando se assume que o poder político nos protege de ameaças. Sendo o estado um agressor por definição, ele não apenas não nos protege de ameaças, como de fato as pratica, e inclusive nos impede de buscar proteção de outros agentes ao estabelecer o monopólio da força.

De acordo com Walter Block, em National Defense and the Theory of Externalities, Public Goods, and Clubs:

Argumentar que um governo cobrador de impostos pode legitimamente proteger seus cidadãos contra agressão é cair em contradição, uma vez que tal entidade inicia todo o processo fazendo exatamente o oposto de proteger aqueles sob seu controle.

Neste mesmo artigo, Block demonstra a inconsistência lógica do conceito de "bens públicos", aqueles que o mercado não seria capaz de prover sozinho e cuja produção dependeria de ação governamental. Então os estados seriam eles próprios bens públicos e, consequentemente, jamais poderiam ter surgido, uma vez que eles nem sempre existiram. Pode-se ainda concluir que o estado não é um bem, e sim um mal, afinal, uma vez provada a absurdidade lógica do conceito de bem público, não há sequer uma justificativa utilitarista para a existência do estado, e nem explicação para seu surgimento que não a sistematização de práticas criminosas em algum estágio da civilização.

De fato, recentes descobertas arqueológicas evidenciam a origem violenta do estado. O mais antigo caso de formação de estado na América Central, há cerca de 2000 anos, foi o do estado zapoteca de Oaxaca, que emergiu após cerca de 450 anos de conflitos. Segundo o antropólogo Charles Spencer em War and early state formation in Oaxaca, Mexico, estados são uma sofisticação do estágio que os precede: grupos liderados por chefes guerreiros (chiefdom, em inglês). Sim, esses grupos são essencialmente quadrilhas bárbaras. O estado é a evolução organizacional destas quadrilhas, uma forma sofisticada de máfia.

Chiefdoms possuíam um único nível decisório e seu raio de influência era limitado pelo alcance de uma cavalgada. Já o estado possui vários níveis hierárquicos e um aparato burocrático que permite a delegação de autoridade administrativa, cobrindo assim áreas muito mais extensas. A transição dos chiefdoms para o estado se deu através de conquista territorial combinada com exigência de tributos. Estes tributos são exatamente aquilo que Don Fanucci cobrava em Little Italy: taxa de proteção contra si próprio.

Hoje usamos eufemismos como "imposto" e "contribuinte". Na Inglaterra a regularização formal do conceito de imposto tem origem no Dannegeld — os tributos cobrados pelos invasores danos (tribo germânica que habitava a atual Dinamarca) para ir embora da ilha e deixar as pessoas em paz. Os conquistadores normandos faziam o mesmo.

Serviços como defesa, segurança e justiça são demandados pelo consumidor e produzidos, ainda que de forma extremamente ineficiente e de péssima qualidade, pelo monopólio coercivo estatal. Não há, portanto, razão para duvidar da capacidade dos empreendedores privados de provê-los, uma vez que estão sujeitos à competição de mercado e devem agradar o cliente se quiserem lucrar. Em Da Produção Privada de Segurança, Gustave de Molinari escreve:

Em todos os casos, para todas as mercadorias que servem à provisão das necessidades tangíveis ou intangíveis do consumidor, é do maior interesse dele que o trabalho e o comércio permaneçam livres, porque a liberdade do trabalho e do comércio tem, como resultado necessário e permanente, a redução máxima do preço.

Há exemplos históricos que comprovam a aplicabilidade desta teoria em qualquer caso: A competição entre cortes privadas na Islândia Medieval; a Lex Mercatoria, um corpo de leis comerciais estabelecidas espontaneamente por mercadores medievais. E incontáveis milícias, exércitos privados, polícias privadas e grupos de resistência civil que derrotaram impérios poderosos ou supriram as deficiências dos serviços estatais. Shoppings Centers são mais seguros que praças públicas, apesar de toda a restrição que a legislação impõe às empresas de segurança patrimonial.

A lógica da privatização total seria também um arranjo mais ordeiro. De acordo com Hans-Hermann Hoppe em As Falácias da Teoria dos Bens Públicos e da Produção de Segurança, um sistema competitivo no mercado de segurança implicaria "erigir uma estrutura institucionalizada de incentivos para produzir ordem legal e aplicação legal que incorpore o mais alto grau de consenso relativo à questão da resolução de conflitos."


Some-se a isso a impossibilidade de socializar os custos dos conflitos através do poder estatal de taxação e fica claro que numa sociedade sem estado as pessoas desfrutarão de um nível maior de paz e ordem.

Diogo Coelho diz que o governo pode se valer da coerção física para cobrar impostos, pois seu pagamento é garantido por lei. O autor renuncia completamente à reflexão ética e moral ao fazer semelhante afirmação, além de desconhecer o significado da palavra "lei" e por consequência, a distinção entre "lei" e "legislação". A única lei que existe é a Lei Natural. Como jusnaturalista clássico católico, acredito na origem divina dos direitos naturais do homem, como proposto por São Tomás de Aquino. Mas autores ateus como Rothbard, Kinsella e Molineux apresentam também deduções lógicas dos direitos naturais, a saber: vida, liberdade e propriedade.

Direito é aquilo que ninguém deve tirar de uma pessoa e a lei impõe ao indivíduo a obrigação negativa de não infringir esses direitos. Lei é diferente de legislação estatal, que é apenas uma série de ameaças escritas com linguajar jurídico.

No lugar de:

 — Perdeu playboy, passa a grana ou toma bala!

Temos:

— Constitui crime de sonegação fiscal: prestar declaração falsa ou omitir, total ou parcialmente, informação que deva ser produzida a agentes das pessoas jurídicas de direito público interno, com a intenção de eximir-se, total ou parcialmente, do pagamento de tributos, taxas e quaisquer adicionais devidos por lei (leia-se legislação).

Argumentar que legislação é lei implica a falácia da definição circular. Qual lei nos obriga a seguir a legislação? Apanhar um pedaço de papel e rabiscar palavras de ordem não gera direito. Não importa se você é um psicopata em um manicômio ou membro de uma quadrilha altamente sofisticada e respaldada por uma maioria de eleitores. Em última instância, a legislação estatal está respaldada apenas pelo cano de um fuzil.

A força física pode ser oriunda de maior aptidão para a guerra, como no caso dos chiefdom, ou da superioridade numérica de uma massa manipulada, como no caso das democracias, mas ainda assim é pura força física. Quanta barbárie, roubo, terror, genocídio, pogroms, perseguições, guerra e terrorismo já foram cometidos em nome da legislação?


Por Paulo Kogos em

https://www.mises.org.br/blogpost/1748/imposto-e-roubo-estado-e-quadrilha-e-outras-consideracoes

Continua...



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