Do livro
Dei Gloria Intacta
De Jan Van Rijckenborg
(...) Eis por que toda sabedoria dialética, tanto a intelectual como a esotérica, é loucura para o homem divino. E é conscientemente que a Rosacruz moderna combate os aspectos esotéricos do homem terrestre e os seus resultados.
É falso dizer que o “eu”, atualmente ligado ao ser humano inferior, encontrará, em dado momento, seu ser real e nele se fundirá. Não, o verdadeiro “eu”, a verdadeira centelha divina, se encontra no ser real, e é essa verdadeira centelha divina do ser celeste que deve ser libertada do “eu” do homem terrestre. Portanto, o que ocorre é que invertemos as coisas: o homem terrestre que quer ser libertado deve ser aniquilado! O Outro, o homem celeste, deve crescer; o homem terrestre deve diminuir!
Isso se realiza pelo auto-esvaziamento, pela autonegação, pela autodestruição, pela auto-renúncia, pela anulação total do ser humano dialético, com auxílio da Hierarquia de Cristo, que nos dá a força para isso.
Realiza-se atacando (...) todas as nossas ilusões. Realiza-se, reconhecendo a incapacidade de todos os supostos poderes superiores do homem terrestre e do potencial de magia a eles relacionado, os quais podem ser sempre explicados pelo seu passado natural. Realiza-se, tal como um penitente, como um monge mendicante, como um precursor, quando libera as veredas ao verdadeiro homem divino, repetindo, como João, o Batista: “Ele deve crescer, eu devo diminuir”.
Tal processo pode ser realizado somente quando o velho homem “coloca sua cabeça no cepo”. É dessa oblação que nasce o homem celeste. Não é o “eu” que recebe o homem celeste, ou o homem celeste que “me” recebe, mas é pelo meu desaparecimento que “eu” abro caminho ao filho de Deus. Isso, naturalmente, representa um processo. À medida que um ser desaparece, o outro deve despertar. Por isso muitos perigos espreitam agora o aluno nesse caminho. Ele corre o perigo de tomar os frutos do velho Adão pelos do novo Adão e deles cuidar. A velha natureza é astuciosa, e o homem aferra-se de bom grado àquilo que ele tanto gostaria de conservar.
Sede prudentes, pois poderia acontecer que aqueles a quem evitamos como prostitutas e publicanos nos ultrapassem no caminho da libertação! Como os homens são escravos da lei! Todos sabem exatamente o que é ou não é permitido! Todos sabem aconselhar uns aos outros tão bem! Todos têm à sua disposição um conhecimento de primeira mão e a sua clarividência – um claro isto e um perfeito aquilo.
Porém nós vos dizemos: tudo isso é nada; pelo menos é inadequado. O alcance espiritual do estado dialético do homem é insuficiente. O conhecimento, a visão e os poderes humanos segundo a natureza são limitados; e isso é posto em evidência nos evangelhos.
Em todos os instantes psicológicos, quando é chegado o momento crítico, quando se trata de “tudo ou nada”, (...) o Evangelho quer fazer-vos compreender que a sabedoria dos homens e suas conseqüências são insignificantes quando se trata das exigências e da realidade concernentes ao homem celeste.
Quando João Batista já se encontra na prisão, à espera da execução, envia uma mensagem a Jesus com a pergunta: “És tu aquele que deve vir ou devemos esperar por outro?” Compreendei bem essa pergunta! Não se trata aqui de dúvida, de vacilação, porém essa pergunta é suscitada para fazer compreender ao aluno que a soma de sua cultura espiritual segundo a natureza é insuficiente quando se refere ao outro.
Em virtude de seu estado inferior, os homens caminham em dilemas, e nada pode mudar essa situação, nem mesmo um suposto desenvolvimento esotérico. Mas então, como ensinam certos místicos, esse conjunto de sabedoria, essas reformas, a soma de nossas experiências e de nossas aspirações em direção à Luz, tudo isso seria inútil, supérfluo? De modo algum, pois tão logo a força espiritual da reminiscência (essa fraca projeção do ser celeste no ser inferior) seja inflamada na consciência interior do homem e o impulsione, ele já não terá sossego e não poderá abster-se da procura.
Ele, então, perseguirá, com zelo, a sabedoria, a força e a beleza. Nesse momento, o fogo divino abre-lhe sulcos, aflige-o, e ele tenta responder a esse impulso. A cultura surge em sua vida, ele restringe cada vez mais o que é mais especificamente animal. (...) O aluno se converte em “habitante da terra limítrofe”, um habitante de Éfeso. Não pode ultrapassar essa linha divisória, que é como um muro. E, de modo figurado, ele pensa: é um “círculo de giz”, e salta, apenas para ser repelido.
Finalmente, o sofrimento o purifica e o fortifica para o sacrifício e faz que ele veja o seu limite estrutural. E tendo ele sido inflamado em Deus consoante a natureza, deposita totalmente seu ser-eu no sepulcro do tempo e aniquila-se em Jesus, o Senhor, a fim de permitir que o verdadeiro homem se eleve em sua glória.
O que recebeu de Deus e construiu, segundo o ser natural, ele enterra com o seu “eu” na tumba da natureza, a fim de que, crescendo no Espírito Santo, chegue à transmutação da sua personalidade.
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