domingo, 14 de dezembro de 2025

O QUE DEVE SER FEITO - Capítulo 7

Reforma de cima para baixo: convertendo o rei
O problema até 1914 era comparativamente pequeno
e a possível solução era então comparativamente fácil;
e hoje como veremos, as questões são mais difíceis e a
solução é muito mais complicada. Na metade do século
XIX, tanto na Europa quanto nos Estados Unidos, não
somente o grau de centralização política era muito menor
do que é agora; a Guerra de Independência Sulista ainda
não havia ocorrido, e nem a Alemanha ou a Itália existiam
como estados unificados.

Mas especialmente, a era da democracia em massa mal
havia se iniciado nesta época. Na Europa, após a derrota
de Napoleão, os países ainda eram governados por reis
e príncipes, e eleições e parlamentos desempenhavam
papéis secundários e, além disso, eram restritas a números
extremamente pequenos de grandes proprietários.
Similarmente, nos Estados Unidos, o governo era gerido
por pequenas elites aristocráticas, e o voto era restrito por
rigorosos requerimentos de propriedade. Afinal, apenas
aquelas pessoas que possuem algo a ser protegido deveriam
gerir aquelas agências que desempenham a proteção.
Há 150 anos, ou mesmo há 100 anos, apenas as seguintes
coisas eram essenciais para resolver o problema. Teria sido
necessário apenas forçar o rei a declarar que dali em diante,
todo cidadão seria livre para escolher seu próprio protetor,
e jurar lealdade a qualquer governo que ele quisesse. Ou
seja, o rei não mais presumiria ser o protetor de alguém, a
menos que esta pessoa solicitasse a ele, e concordasse com
o valor que o rei cobrasse por tal serviço.

O que teria acontecido neste caso? O que teria
acontecido se, digamos, o imperador da Áustria tivesse
feito tal declaração em 1900? Tentarei dar um cenário ou
rascunho resumido do que eu acho que provavelmente
teria acontecido nesta situação.
Primeiro, todo mundo, diante desta declaração, teria
reassegurado seu direito irrestrito a autodefesa, e teria sido
liberado para decidir se ele queria mais ou melhor proteção
do que a proporcionada pela autodefesa, e se quisesse,
onde e de quem adquirir esta proteção. A maioria das
pessoas nesta situação indubitavelmente teria escolhido
tirar proveito da divisão do trabalho, e contar, além da
autodefesa, também com protetores especializados.
Segundo, na procura por protetores, praticamente todo
mundo recorreria a pessoas ou agências que possuíssem,
ou fossem capazes de adquirir, os meios de assegurar
a tarefa de proteção – isto é, que tivessem elas próprias
um interesse no território a ser protegido na forma de
investimentos substanciais em propriedades – e que
possuíssem uma estabelecida reputação de confiáveis,
prudentes, honrosos e justos.
É seguro dizer que ninguém teria escolhido um
parlamento eleito para desempenhar esta tarefa. Ao invés
disso, quase todos teriam procurado ajuda em um ou
mais destes três locais: ou o próprio rei, que neste ponto
não é mais um monopolista; ou um nobre, magnata ou
aristocrata regional ou local; ou mesmo uma companhia
internacional de seguros em atuação.
Obviamente, o próprio rei iria satisfazer estes
requerimentos que acabei de mencionar, e muitas pessoas
o teriam escolhido voluntariamente como seu protetor.
Ao mesmo tempo, porém, muitas pessoas também iriam
apartar-se do rei; destas, uma grande parte provavelmente
iria se voltar a vários nobres e magnatas regionais, que
seriam neste momento a nobreza natural, ao invés de
hereditária. E em uma escala territorial menor estes
nobres locais teriam sido capazes de oferecer as mesmas
vantagens como protetores que o próprio rei seria capaz
de oferecer. E esta mudança para protetores regionais
teria acarretado em uma descentralização significativa
na organização e na estrutura da indústria de segurança.
E esta descentralização teria sido apenas um reflexo dos
interesses de proteção privados ou subjetivos, e estariam
de acordo com eles – ou seja, a tendência de centralização
que mencionei anteriormente também levou a uma
centralização excessiva dos negócios de proteção.
Por último, praticamente todas as outras pessoas,
especialmente nas cidades, teriam buscado proteção nas
companhias de seguros comerciais, tipo as de seguro
contra incêndios. Seguro e proteção de propriedade
privada são obviamente assuntos intimamente ligados.
Melhor proteção acarreta em menores compensações
de seguro. E com seguradores entrando no mercado de
proteção, rapidamente os contratos de proteção, ao invés
de promessas indefinidas, teriam se tornado o produto
padrão pelo qual a proteção seria ofertada.
Além disso, em virtude da natureza do seguro, a
competição e a cooperação entre várias seguradoras
protetoras promoveriam o desenvolvimento de regras
universais de procedimento, evidência, resolução
de conflito e arbitragem. Igualmente, promoveriam
a homogeneização e heterogeneização simultâneas
da população em diversas classes de indivíduos com
diferentes grupos de risco relativos à proteção de suas
propriedades, e correspondentemente, diferentes prêmios
de seguro de proteção. Toda a distribuição sistemática e
Reforma de cima para baixo: convertendo o rei
previsível de riqueza e rendimento entre os diferentes
grupos dentro da população como existiam sob condições
monopolísticas seria imediatamente eliminada. E isto
logicamente promoveria a paz.
E o que é ainda mais importante, a natureza da
proteção e da defesa teriam sido fundamentalmente
alteradas. Sob condições monopolísticas, existe somente
um protetor; sendo ele monárquico ou democrático não
faz diferença neste ponto, um governo é invariavelmente
concebido como um defensor e protetor de um território
fixo e contínuo. Todavia, esta característica é resultado de
um monopólio de proteção compulsório. Com a abolição
de um monopólio, esta característica iria desaparecer
imediatamente por ser extremamente anormal e até
artificial. Poderia vir a existir uns poucos protetores locais
que defendessem apenas um território contínuo. Mas
também existiriam outros protetores, como o rei ou as
agências de seguro, cujo território protegido consistisse
de pedaços, partes e trechos remedados descontínuos.
E as “fronteiras” de todo governo estariam num fluxo
constante. Particularmente nas cidades, não seria mais
incomum dois vizinhos terem agências de proteção
diferentes, do que terem diferentes seguradoras contra
incêndio.
Esta estrutura retalhada de proteção e defesa aprimora
a proteção. A defesa monopolística contínua presume
que os interesses em segurança de toda a população de
determinado território sejam de certa forma homogêneos.
Isto é, que todas as pessoas em um determinado território
possuam o mesmo tipo de interesse em defesa. Porém,
esta é uma suposição extremamente irrealista; na verdade
é falsa. Na verdade, as necessidades de segurança das
pessoas são altamente heterogêneas. As pessoas podem
simplesmente possuir propriedades em um local, ou em
diversos locais espalhados territorialmente, ou elas podem
ser praticamente autossuficientes, ou apenas dependentes
de poucas pessoas nos seus afazeres econômicos; ou, por
outro lado, elas podem estar profundamente integradas
no mercado e dependentes economicamente de milhares
e milhares de pessoas espalhadas por enormes territórios.

A estrutura em retalhos da indústria de segurança
iria apenas refletir esta realidade de necessidades
extremamente diversificadas em segurança que existe
em pessoas variadas. Igualmente, esta estrutura iria por
sua vez estimular o desenvolvimento de um armamento
de proteção correspondente. Ao invés de produzir e
desenvolver armas e instrumentos de bombardeio em larga
escala, instrumentos seriam desenvolvidos para a proteção
de territórios de pequena escala sem danos colaterais.
Além disso, porque toda redistribuição de renda e de
riqueza inter-regional seria eliminada em um sistema
competitivo, a estrutura retalhada também iria oferecer as
melhores garantias de paz inter-regional. A probabilidade
e as extensões de conflitos inter-regionais seriam reduzidas
se houvesse retalhos. E porque todo invasor estrangeiro,
por assim dizer, iria quase que instantaneamente, mesmo
se ele invadisse apenas um pequeno pedaço de terra,
se deparar com a oposição e contra-ataques militares
e econômicos vindos de várias agências de proteção
independentes, da mesma forma, o perigo de invasões
estrangeiras seria reduzido.
Indiretamente, já está claro ao menos parcialmente
como e por que ficou muito mais difícil alcançar esta
solução no decorrer dos últimos 150 anos. Deixe-me
apontar algumas das mudanças fundamentais que
ocorreram que tornaram todos esses problemas muito
maiores. Primeiro, não é mais possível realizar as reformas
Reforma de cima para baixo: convertendo o rei
de cima para baixo. Os liberais clássicos, durante a época
das antigas monarquias, poderiam ter achado, e de fato
frequentemente achavam, e poderiam ter realmente
acreditado em simplesmente convencer o rei de seus
pontos de vista, e pedido para ele abdicar de seu poder, e
todo o resto estaria automaticamente resolvido.
Hoje em dia, o monopólio de proteção do estado é
considerado público, ao invés de propriedade privada,
e o poder do governo não está mais atrelado a nenhum
indivíduo em particular, e sim a funções específicas,
exercidas por indivíduos anônimos ou ocultos
representados como membros de um governo democrático.
Portanto, a estratégia de conversão de apenas um homem
ou de poucos homens não mais se aplica. Não importa
se alguns membros do alto escalão do governo sejam
convencidos – o presidente e alguns senadores – porque,
dentro das regras do governo democrático, nenhum
indivíduo isolado possui o poder pessoal de abdicar do
monopólio governamental de proteção. Os reis tinham
esse poder; o presidente não.
O presidente pode somente renunciar, apenas para
ser substituído por outra pessoa. Mas ele não pode
dissolver o monopólio de proteção do governo, porque
teoricamente o povo é o dono do governo, e não o
próprio presidente. Então, sob o governo democrático,
a abolição do monopólio governamental de justiça e
proteção requer ou que uma maioria do público e de seus
representantes eleitos declarasse a abolição do monopólio
de proteção governamental e correspondentemente de
todos os impostos, ou de forma ainda mais restritiva, que
literalmente ninguém fosse votar e o eleitorado fosse zero.
Somente neste caso poderíamos dizer que o monopólio
de proteção do governo foi efetivamente abolido. Mas
essencialmente isso significaria que seria impossível algum
dia nos livrarmos de uma perversão moral e econômica.
Porque hoje em dia é um fato consumado que todo mundo,
incluindo a turba, toma parte da política, e é inconcebível
que a turba iria algum dia, em sua maioria ou mesmo
plenamente, renunciar ou se abster de exercer seu direito
de voto, que não é nada além de exercer a oportunidade de
pilhar a propriedade alheia.
Além do mais, mesmo se assumíssemos contra todas
as chances que isso possa ser alcançado, os problemas não
acabariam. Porque outra verdade sociológica fundamental
da era da democracia de massa igualitária moderna é a
quase completa destruição das elites naturais. O rei poderia
abdicar de seu monopólio e as necessidades de segurança
do povo ainda teriam sido quase que automaticamente
atendidas porque existia para a maioria o próprio rei,
e também nobres locais e regionais e as principais
personalidades do mundo dos negócios, uma elite natural,
claramente visível, estabelecida e voluntariamente
reconhecida e uma estrutura complexa de hierarquias, e
ordens de classificação que as pessoas poderiam se voltar
para satisfazer seus desejos de serem protegidas.
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sábado, 13 de dezembro de 2025

A IGREJA ORTODOXA - Relações ortodoxas com outras comunhões

 

10. Relações ortodoxas com outras comunhões: «oportunidades e problemas»

As Igrejas Orientais «separadas»

Quando pensam em unidade, os Ortodoxos olham não só para o Ocidente, mas pra seus vizinhos no oriente, os Nestorianos, e os Monofisistas. De muitos modos, a Ortodoxia está mais próxima das Igrejas "separadas" do Oriente que de qualquer confissão ocidental.

10.1 - Os Nestorianos

São hoje em número muito reduzidos, talvez 50.000, e quase inteiramente desprovido de teólogos, assim é difícil entrar em negociação com eles. Mas uma união parcial entre ortodoxos e Nestorianos já ocorreu. Em 1998 um Nestoriano assírio, Mar Ivanos, Bispo de Urumia, na Pérsia, junto com seu rebanho, foi recebido em comunhão pela Igreja Russa. A iniciativa coube primariamente ao lado Nestoriano, e não houve pressão, política ou de outro tipo, de parte dos Russos. Em 1905 essa diocese ex-Nestoriana dizia-se ter 80 paróquias e 70.000 féis; mas entre 1915 e 1918 os Ortodoxos Assírios foram assassinados pelos turcos numa série de massacres não provocados, dos quais poucos milhares escaparam. Mesmo tendo sido sua vida cortada logo e tão tragicamente, a reconciliação dessa antiga comunidade Cristã forma um precedente encorajador: Porque não poderia a Igreja Ortodoxa de hoje chegar a um entendimento similar com o resto da comunhão Nestoriana? (Quando visitando um convento perto de Nova York em 1960, eu tive o prazer de encontrar um Bispo Ortodoxo Assírio, originalmente da comunidade de Urumia, também chamado Mar Ivanios (sucessor do original Mar Ivanos). Um Padre Casado, tornou-se Bispo depois da morte da mulher. Quando eu perguntei a idade dele as monjas, elas disseram: "Ele diz ter 102, mas seus filhos dizem que ele deve ser muito mais velho que isso").

10.2 - Os Monofisitas

Do ponto de vista prático, estão em uma posição muito diferente dos Nestorianos, pois eles são comparativamente numerosos, mais de dez milhões, e possuem teólogos capazes de apresentar e interpretar sua posição doutrinal tradicional. Numerosos eruditos ocidentais e Ortodoxos hoje acreditam que o ensinamento Monofisita acerca da pessoa de Cristo foi no passado seriamente mal entendido, e que a diferença entre aqueles que aceitam e aqueles que rejeitam os decretos de Calcedônia é largamente, se não mesmo inteiramente verbal. Quando visitando a Igreja Copta Monofisita do Egito em 1959, o Patriarca de Constantinopla falou com grande otimismo: "Na verdade, nós todos somos um, todos somos Cristãos Ortodoxos... Temos os mesmos sacramentos, a mesma história, as mesmas tradições. A divergência está no nível de fraseologia" (Discurso feito no Instituto de Altos Estudos Copta, Cairo, 10 de dezembro de 1959). De todos os contatos "ecumênicos" da Ortodoxia, a amizade com os Monofisitas parece ser o mais desejável e o que mais provavelmente levará a resultados concretos num futuro próximo. A questão de união com os Monofisitas estava bastante no ar nas Conferências Pan-Ortodoxas de Rhodes, e com certeza figurará proeminentemente na agenda de futuros concílios Pan-Ortodoxos. Durante Agosto de 1964 uma muito amistosa "Consulta não-oficial" realizou-se em Aarhus na Dinamarca entre teólogos Ortodoxos e Monofisistas. "Nós todos aprendemos uns com os outros, "declararam os delegados dos dois lados na "declaração de concordância" feita ao final da reunião. "Nossos desentendimentos herdados começaram a ser esclarecidos. Reconhecemos, uns nos outros, a fé Ortodoxa una da Igreja. Quinze séculos de alienação não nos desviaram da fé de nossos Pais."

Consultas adicionais aconteceram em Bristol (1967), Genebra (1970) e Addis Abeba (1971).

10.3 - A Igreja Católica Romana

Entre Cristãos Ocidentais, é com os Anglicanos que a Ortodoxia mantém relações mais cordiais, mas é com os Católicos romanos que a Ortodoxia tem de longe mais em comum. Com certeza há entre a Ortodoxia e Roma muitas dificuldades. As barreiras psicológicas usuais existem. Dentre os Ortodoxos e sem duvida dentre os Católicos Romanos da mesma forma — há uma infinidade de preconceitos herdados que não podem ser rapidamente ultrapassados; e os Ortodoxos não acham fácil esquecer a experiência infelizes do passado — tais como as Cruzadas, a "União" de Brest-Litovski, o cisma em Antioquia no século XVIII, ou a perseguição da Igreja Ortodoxa na Polônia pelo governo Católico Romano entre as duas guerras mundiais. Os Católicos Romanos normalmente não se dão conta de quão profundo é o sentido de receio e apreensão que muitos devotos Ortodoxos — tanto cultos quanto simples — ainda sentem quando pensam na Igreja de Roma. Mais sérias do que estas barreiras psicológicas são as diferenças doutrinais entre os dois lados — acima de tudo o filioque e as prerrogativas papais. Uma vez mais muitos Católicos Romanos falham ao não considerarem quão sérias são as dificuldades teológicas, e quão grande importância os Ortodoxos dão a estes dois assuntos. Mesmo quando tudo foi dito sobre divergências dogmáticas, diferenças na espiritualidade e na abordagem geral, ainda permanece verdadeiro que há muitas coisas que os dois lados compartilham em sua experiência dos sacramentos, por exemplo, e em sua devoção à Mãe de Deus e aos santos — para mencionar apenas duas instâncias em muitas — Ortodoxos e Católicos Romanos são na maior parte muito próximos.

Já que os dois lados têm tanto em comum, haverá, talvez, alguma esperança de reconciliação? À primeira vista, somos tentados a não ter esperança, particularmente quando considera-se a questão das reivindicações papais. Os Ortodoxos acham-se incapazes de aceitar as definições do Concílio Vaticano de 1870 referente à suprema jurisdição ordinária e à infalibilidade do Papa, mas a Igreja Católica Romana considera o Concílio Vaticano ecumênico e então tende a tomar suas definições como irrevogáveis. Entretanto estes assuntos não estão completamente num impasse. Podemos perguntar, quão acertadamente os controversialistas Ortodoxos compreenderam os decretos do Vaticano? Talvez o significado atribuído às definições pela maioria dos teólogos ocidentais nos últimos noventa anos não seja, de fato, a única interpretação possível. Ademais agora é amplamente admitido pelos Católicos romanos que os decretos do Vaticano são incompletos e unilaterais: Falam unicamente do Papa e de suas prerrogativas, mas não falam nada sobre os bispos. Porém agora que o Segundo Concílio vaticano realizou-se uma declaração dogmática sobre as poderes do episcopado, a doutrina Católica romana das prerrogativas papais começaram a aparecer para o mundo Ortodoxo sob uma luz diferente.

E se Roma no passado falou talvez muito pouco sobre a posição dos bispos na Igreja os Ortodoxos por sua vez precisam levar a idéia de Primazia mais a sério. Os Ortodoxos concordam que o Papa é primeiro dentre os Bispos: será que eles se perguntaram cuidadosa e diligentemente o que isto de fato significa? Se a Sé primazial de Roma fosse uma vez mais reunida à Comunhão Ortodoxa, o que seria precisamente este status? Os Ortodoxos não estão dispostos a atribuir ao Papa uma supremacia universal de jurisdição "ordinária," mas não seria possível para eles atribuírem a ele, como Presidente e primaz no colégio dos Bispos, uma responsabilidade universal, um todo-abrangente cuidado pastoral estendendo-se por sobre toda a Igreja? Recentemente o Movimento da juventude Ortodoxa no patriarcado de Antioquia sugeriu duas formulações. "O Papa, dentre os bispos, é o irmão mais velho, estando o pai ausente." "O Papa é a boca da Igreja e do episcopado." Obviamente estas formulações aproximam-se das declarações do Vaticano sobre a jurisdição e infalibilidade Papal, mas podem servir de alguma maneira como base para uma discussão construtiva. Até agora os teólogos Ortodoxos, no calor da controvérsia, muito freqüentemente contentaram-se em apenas atacar a doutrina Romana do Papado (como eles a compreendem) sem aprofundarem-se e declarar em linguagem positiva os que a verdadeira natureza da primazia Papal é do ponto de vista Ortodoxo. Se os Ortodoxos pensassem e falassem mais de maneira construtiva e menos em termos negativos e polêmicos, então a divergência entre os dois lados poderia parecer menos tão absoluta.

Depois de longo adiamento as Igrejas Ortodoxa e Católica Romana estabeleceram em 1980 uma comissão internacional mista para discussões teológicas. Muito vem sendo feito informalmente através de contatos pessoais.

Um trabalho de valor inestimável foi feito pelo Católico Romano "Mosteiro da União" em Chevetogne na Bélgica, fundado originalmente em Amay-sur-Mense em 1926. É um Mosteiro de "Rito duplo" onde os monges oram nos ritos Romano e Bizantino: O periódico de Chevetogne, Irénikon, contem um relato precioso e simpático dos assuntos atuais na Igreja Ortodoxa, bem como inúmeros estudos, com freqüência fornecidos por Ortodoxos.

Com certeza, deve-se ser sóbrio e realista: a união entre a Ortodoxia e Roma, se algum dia acontecer, será uma tarefa de extraordinária dificuldade. Porém os sinais de uma reaproximação crescem dia a dia. O Papa Paulo VI e o Patriarca Atenágoras de Constantinopla encontraram-se três vezes (Jerusalém, 1964; Constantinopla e Roma, 1967); em 7 de dezembro de 1965 os anátemas de 1054 foram simultaneamente retirados pelo Concílio Vaticano em Roma e o Santo Sínodo em Constantinopla; em 1979 o Papa João Paulo II visitou o Patriarca Dimitrios. Através de tais gestos simbólicos a confiança mútua está sendo criada.

10.4 - Os Velhos-Católicos

Era mais do que natural que os Velhos Católicos que se separaram de Roma depois do Concílio Vaticano de 1870 tivessem entrado em negociações com os Ortodoxos. Os Velhos Católicos queriam recuperar a fé verdadeira da antiga "Igreja Indivisa" usando como base os Padres e os sete Concílios Ecumênicos: Os Ortodoxos argumentaram que estas fé não era meramente uma coisa do passado, a ser reconstruída por uma pesquisa arcaica, mas uma realidade presente a qual, pela graça de Deus, eles jamais deixaram de possuir. Os dois lados encontraram-se em numerosas conferências, em particular em 1874 e 1875, em Roterdam em 1894, de novo em Bonn em 1931 e em Rheifieden em 1957. Uma grande parte de concordância doutrinal foi alcançada nesses encontros, embora não tenham levado a nenhum resultado prático, embora as relações entre Velhos Católicos e Ortodoxos continuem a ser muito amistosas, nenhuma união foi efetivada. Em 1975 um diálogo teológico em larga escala foi resumido entre as duas Igrejas, e uma importante série de declarações doutrinais foram feitas, mostrando uma vez mais o quanto os dois lados têm em comum.

10.5 - A Comunhão Anglicana

Como no passado hoje em dia há muitos Anglicanos que vêem a Reforma Inglesa do século XVI como nada além do que um arranjo interino que apela, como os Velhos Católicos, para os Concílios Gerais, os Padres e a tradição da "Igreja Indivisa." Pensa-se no Bispo Pearson no século XVII, com seu apelo: "Buscai como era no começo; ide à nascente da fonte; olhai para a antiguidade." Ou no Bispo Ken, o não-Juror, que disse: "Morro na fé da Igreja Católica, antes da desunião do ocidente e do oriente." Esta chamada à antiguidade levou muitos Anglicanos a olharem com simpatia e interesse a Igreja Ortodoxa, e da mesma forma, levou muitos Ortodoxos a olharem com interesse e simpatia o Anglicanismo. Como resultado do trabalho pioneiro de Anglicanos tais como William Palnur (1811-1879) (Recebido na Igreja Católica Romana em 1855). J.M.Neale (1818-1866), and W.J.Birbeck (1859-1916). As relações Anglo-Ortodoxas durante os últimos 100 anos desenvolveu-se e floresceu de forma bastante viva.

Várias conferências entre teólogos Ortodoxos e Anglicanos foram realizadas. Em 1930, uma delegação Ortodoxa representando dez Igrejas Autocéfalas (Constantinopla, Alexandria, Antioquia, Jerusalém, Grécia, Chipre, Sérvia, Bulgária, Romênia, Polônia) foi enviada à Inglaterra por ocasião da conferência Lambeth, e manteve diálogos com um comitê de Anglicanos; e no ano seguinte uma Junta Anglicana-Ortodoxa reuniu-se em Londres, com representantes das mesmas Igrejas de 1930 (exceto Búlgaros).

Tanto em 1930 quanto em 1931 uma tentativa honesta foi feita no sentido de encarar os pontos de discordância doutrinal. Dentre os tópicos levantados estavam a relação entre Escrituras e Tradição, a Processão do Espírito Santo, a doutrina dos sacramentos, e a idéia Anglicana de autoridade na Igreja. Uma conferência similar realizou-se em 1935 em Bucareste, com delegados Anglicanos e Romenos. Esta reunião concluiu suas deliberações declarando: "Uma base sólida foi preparada por meio da qual uma completa concordância dogmática pode ser afirmada entre as comunhões Ortodoxa e Anglicana. Em retrospectiva, estas palavras parecem demasiadamente otimistas. Durante os anos trinta os dois lados pareciam estar fazendo grande progresso em direção a uma completa concordância dogmática e muitos — especialmente do lado dos Anglicanos — começaram a pensar que em breve viria um tempo em que as Igrejas Ortodoxa e Anglicana estariam em comunhão. Desde 1945, entretanto, tornou-se claro que tal esperança era prematura: a completa concordância dogmática e a comunhão nos sacramentos estão ainda muito longe. A maior conferência teológica entre Anglicanos e Ortodoxos realizada desde a guerra, em Moscou em 1956, foi muito mais cautelosa do que as que a precederam nos anos trinta. A primeira vista seus veredictos parecem ser, comparativamente, pobres e decepcionantes, mas na verdade eles constituem uma avanço importante, pois são marcados por um realismo visivelmente maior. Nas conferências entre as guerras havia a tendência de selecionar pontos específicos de discordância e de considerá-los isoladamente. Em 1956 um esforço genuíno foi feito no sentido de levar a questão inteira para um nível mais profundo: não somente saídas particulares mas a própria fé das duas Igrejas foi discutida, assim pontos específicos poderiam ser vistos em um contexto mais amplo.

Um diálogo teológico oficial envolvendo todas as Igrejas Ortodoxas e a Comunhão Anglicana inteira começou em 1973. Em 1977-1978 ocorre uma crise nas conversações por conta da Ordenação de mulheres presbíteras em várias Igrejas Anglicanas. As conversações continuaram mas o progresso tornou-se lento.

Nos últimos quarenta anos um grande número de Igrejas Ortodoxas fizeram declarações sobre a validade das Ordens Anglicanas. À primeira vista estas declarações parecem contradizer uma a outra de forma curiosa e extraordinária:

«Seis Igrejas fizeram declarações que parecem reconhecer as ordenações Anglicanas como sendo válidas: Constantinopla (1922), Jerusalém e Sinai (1923), Chipre (1923, Alexandria (1930), Romênia (1936).»

A Igreja Russa no Exílio, no Sínodo de Karkovtzy de 1935, declarou que o clero Anglicano que se tornasse Ortodoxo deveria ser reordenado. Em 1948, numa grande conferência realizada em Moscou, o Patriarcado de Moscou promulgou um decreto com a mesma posição, o qual foi também assinado pelos delegados oficiais (presentes na conferência) das Igrejas de Alexandria, Antioquia, Sérvia, Bulgária, Romênia, Geórgia e Albânia.

Para interpretar estas declarações, seria necessário discutir em detalhes a visão Ortodoxa da validade dos sacramentos, que não é a mesma dos teólogos ocidentais, e também o conceito Ortodoxo de "economia eclesiástica," e estes temas são tão complexos e obscuros que não poderiam ser levados a fundo aqui. Porém certos pontos devem ser mencionados. Primeiro, as Igrejas que se declararam a favor das Ordens Anglicanas aparentemente não sustentaram sua decisão. Recentemente, quando o clero Anglicano aproximou-se do Patriarcado de Constantinopla visando entrar na Igreja Ortodoxa, tornou-se evidente para eles que seriam recebidos como leigos e não como padres.

Segundo, as declarações favoráveis tomadas por grupos (1) são cuidadosamente qualificadas e devem ser vistas como provisionais. O Patriarcado Ecumênico, por exemplo, quando comunicou a decisão de 1922 ao Arcebispo de Canterbury, disse em sua nota de abertura: "É evidente que ainda não se trata aqui de um decreto de toda a Igreja Ortodoxa. Pois é necessário que o resto das Igrejas Ortodoxas tenham a mesma opinião da santíssima Igreja de Constantinopla." Em terceiro lugar, a Ortodoxia é extremamente relutante em fazer julgamentos sobre o status dos sacramentos realizados por não-Ortodoxos. A maior parte dos Anglicanos entendeu as declarações feitas por grupo (1) como constituindo um "reconhecimento" das Ordens Anglicanas no presente momento. Mas na verdade os Ortodoxos não estavam tentando reponder a pergunta "As ordenações Anglicanas são válidas em si, aqui e agora? "Eles tinham em mente uma questão bastante diferente: "Supondo que a comunhão Anglicana fosse para alcançar a completa concordância na fé com os Ortodoxos, seria então necessário reordenar o clero Anglicano?"

Isto ajuda a explicar porque em 1922 Constantinopla pôde declarar-se favorável às ordenações Anglicanas, embora na prática trate-as como inválidas: esta declaração favorável não podia ser efetiva visto que a Igreja Anglicana não era plenamente Ortodoxa na fé. Quando as coisas são vistas sob esta luz, o decreto de Moscou de 1948 não parece mais inteiramente inconsistente com as declarações do período pré-guerra. Moscou baseou sua decisão na presente discrepância entre as crenças Anglicana e Ortodoxa. "A Igreja Ortodoxa não pode concordar em reconhecer a retidão dos ensinamentos Anglicanos sobre os sacramentos em geral, e sobre o sacramento da Santa Ordenação em Particular; e então não pode reconhecer as ordenações Anglicanas como válidas." (Note-se que a teologia Ortodoxa nega-se a tratar da questão da validade das ordenações isoladamente, mas considera, ao mesmo tempo, a fé da Igreja em questão).

Porém, assim continua o decreto de Moscou, se no futuro a Igreja Anglicana tornar-se completamente Ortodoxa na fé, então seria possível reconsiderar a questão. Enquanto dava uma resposta negativa no presente, abria uma esperança para o futuro.

Assim é a situação no que se refere a pronunciamentos oficiais. O clero Anglicano que entre para a Igreja Ortodoxa é reordenado, mas se o Anglicanismo e a Ortodoxia alcançassem uma completa unidade na fé, talvez esta reordenação pudesse não ser considerada necessária. Dever-se-ia acrescentar, entretanto, que um grande número de teólogos Ortodoxos individuais sustentam que sob nenhuma circunstancia seria possível reconhecer a validade das ordens Anglicanas.

Além das negociações oficiais entre líderes Anglicanos e Ortodoxos, realizaram-se muitos encontros construtivos no nível mais pessoal e informal. Duas sociedades na Inglaterra são especialmente devotadas à causa da reunião Anglo-Ortodoxa: A Associação das Igrejas Anglicana e Oriental (cuja organização — Associação da Igreja Oriental, começou em 1863, principalmente com a iniciativa de Neale) e a Fraternidade de Santo Albano e São Sérgio (fundada em 1928), que organiza uma conferência anual e tem um centro permanente em Londres, a Casa de São Basílio (52, ladbroke Grove, W11). A Fraternidade pública um valioso periódico chamado Sobornost, que sai duas vezes por ano; no passado a Associação das Igrejas Anglicana e Oriental publicava também uma revista, o Oriente Cristão, substituída agora por um boletim Informativo.

Qual é o principal obstáculo à união entre Anglicanos e Ortodoxos? Do ponto de vista Ortodoxo há uma grande dificuldade: a compreensão do Anglicanismo, a extrema ambigüidade das formulações doutrinais anglicanas, a ampla variedade de interpretações que estas formulações permite. Há indivíduos anglicanos que estão bem próximos da Ortodoxia, como pode ser visto por qualquer um que leia dois admiráveis panfletos: A Ortodoxia e a Conversão da Inglaterra, por Derwas Chitty; e Anglicanismo e Ortodoxia, por H.A. Hodges. "O problema ecumênico, "conclui o Professor Hodges, é ser visto "como o problema de trazer de volta o, Ocidente... a uma mente sã e a uma vida saudável, isto é a Ortodoxia... A fé Ortodoxa, aquela Fé que os Padres Ortodoxos testemunharam e da qual a Igreja Ortodoxa é a guardiã permanente, é a Fé Cristã em sua forma essencial e verdadeira." (Anglicanismo e Ortodoxia, pg. 46-7). No entanto há muitos outros Anglicanos que divergem ferozmente deste julgamento e que vêem a Ortodoxia como corrupta na doutrina e herética. A Igreja Ortodoxa, apesar de seu desejo profundo de união, não pode entrar em relação próxima com a comunhão Anglicana até que os próprios Anglicanos sejam mais claros a respeito de sua crença. As palavras do general Kereen são tão verdadeiras hoje quanto forma há cinqüenta anos atrás: "Nós Orientais sinceramente desejamos chegar a um entendimento com a grande Igreja Anglicana, mas este feliz resultado não pode ser alcançado... a menos que a Igreja Anglicana torne-se homogênea e a doutrina de suas partes constitutivas tornem-se idênticas" (Le Géneral Alexandre Kerreff et l’ancien _ Catholicisme, editado por Olga Norikoff, Berna, 1911, P.224).

10.6 - Outros Protestantes

Os Ortodoxos têm muitos contatos com os Protestantes no Continente, sobretudo na Alemanha e (em menor grau) na Suécia. As discussões Tubingem do século dezesseis foram reabertas no século vinte, com resultados mais positivos.

10.7 - O Conselho Mundial de Igrejas

Na Igreja Ortodoxa hoje existem duas atitudes diferentes em relação ao Conselho Mundial das Igrejas e o "Movimento Ecumênico." Uma parte sustenta que os Ortodoxos deveriam não tomar parte no Conselho Mundial (ou no máximo enviar observadores aos encontros, mas não delegados); a participação plena no Movimento Ecumênico compromete a reivindicação da Igreja Ortodoxa de ser a única verdadeira Igreja de Cristo e sugere que todas as "Igrejas" são iguais. Típica deste ponto de vista é a declaração feita em 1938 pelo Sínodo da Igreja Russa no Exílio.

Os Cristãos Ortodoxos devem olhar a Santa Igreja Católica Ortodoxa como a verdadeira Igreja de Cristo, uma e única. Por esta razão, a Igreja Ortodoxa Russa no Exílio proibiu seus filhos de tomarem parte no movimento Ecumênico que baseia-se no princípio da igualdade de todas as religiões e confissões Cristãs.

Mas — assim teria objetado o segundo partido — isto é entender completamente errado a natureza do Conselho Mundial das Igrejas. Os Ortodoxos, em participando, não dizem com isso que eles vêem todas as confissões Cristãs como iguais, nem comprometem a reivindicação Ortodoxa de ser a verdadeira Igreja. Como tão cuidadosamente apontou a Declaração de Toronto de 1950 (adotada pelo Comitê Central do Conselho Mundial): a Inscrição no Conselho Mundial não implica a aceitação de uma doutrina específica referente à natureza da unidade do Conselho... A inscrição não implica que cada Igreja tenha que olhar as outras Igrejas participantes como Igreja no verdadeiro e pleno sentido da palavra. Em vista desta declaração explícita (assim argumenta o segundo partido), os Ortodoxos podem tomar parte no Movimento Ecumênico sem por em risco a sua Ortodoxia, E se os Ortodoxos podem participar então assim devem proceder: pois já que eles acreditam ser a fé Ortodoxa verdadeira, é seu dever dar testemunho desta fé o mais amplamente possível.

A existência destes dois pontos de vista conflitantes conta para a algo confusa e inconsistente política que a Igreja Ortodoxa seguiu no passado. Algumas Igrejas têm enviado regularmente delegações ao Movimento Ecumênico, outras espasmodicamente ou quase nunca. Aqui está uma breve análise da representação Ortodoxa durante 1927-28:

  1. Lausane, 1927 (Fé e Ordem): Constantinopla, Alexandria, Jerusalém, Grécia, Chipre, Sérvia, Bulgária, Romênia, Polônia.
  2. Edimburgo, 1937 (Fé e Ordem): Constantinopla, Alexandria, Antioquia, Jerusalém, Grécia, Chipre, Bulgária, Polônia, Albania.
  3. Amsterdã, 1948 (Conselho Mundial de Igrejas): Constantinopla, Grécia, Igreja Romena na América.
  4. Lund, 1952 (Fé e Ordem): Constantinopla, Antioquia, Chipre, Jurisdição Norte-Americana de Russo.
  5. Evariston, 1954 (Conselho Mundial de Igrejas) Constantinopla, Antioquia, Grécia, Chipre, Jurisdição Norte-Americana de Russos, Igreja Romena na América.
  6. New Delhi, 1961 (Conselho Mundial de Igrejas) Constantinopla, Alexandria, Antioquia, Jerusalém, Grécia, Chipre, Rússia, Bulgária, Romênia, Polônia, jurisdição Norte-Americana de Russos, Igreja Romena na América.
  7. Uppsala, 1968 (Conselho Mundial de Igrejas) Constantinopla, Alexandria, Antioquia, Jerusalém, Chipre, Rússia, Bulgária, Romênia, Sérvia, Geórgia, Polônia, Jurisdição Norte-Americana de Russo, Igreja Romena na América.

Como pode ser visto por este resumo, o Patriarcado de Constantinopla sempre esteve representando nestas conferências. Desde o começo ele manteve firmemente uma política de total participação no Movimento Ecumênico. Em janeiro de 1920 o Patriarcado publicou uma carta famosa endereçada "A todas as Igrejas de Cristo, onde quer que esteja, pedindo uma mais íntima cooperação entre corpos Cristãos separados, e sugerindo uma aliança de Igrejas, paralela a recém-formada liga das Nações; muitas das idéias nesta carta antecipam desenvolvimentos posteriores no Movimento Ecumênico. Mas enquanto Constantinopla aderiu sem hesitar aos princípios de 1920, outras Igrejas foram mais reservadas. A Igreja da Grécia, por exemplo, declarou a um certo momento que somente enviaria leigos como delegados ao Conselho Mundial, embora esta decisão tenha sido revogada em 1961. Algumas Igrejas Ortodoxas foram até mais longe do que isto: na Conferência de Moscou em 1948, foi passada uma resolução condenando toda participação no conselho Mundial. Esta resolução foi declarada rudemente: "Os objetivos do Movimento Ecumênico... em seu presente estado não corresponde nem aos ideais do Cristianismo nem à missão da Igreja de Cristo, como compreende a Igreja Ortodoxa." Isto explica porque em Amsterdã, Lunk e Evanston as Igrejas Ortodoxas atrás da Cortina de Ferro não estavam representadas. Entretanto, em 1961, o Patriarcado de Moscou inscreveu-se para o Conselho Mundial e foi aceito, e isto abriu caminho a outras Igrejas ortodoxas no mundo comunista para também tornarem-se membros. Daí em diante, até onde se pode julgar, os Ortodoxos, terão um papel mais completo e mais efetivo no Movimento Ecumênico do que tiveram até então. Mas não se deve esquecer que ainda há muitos Ortodoxos — incluindo um grande número de Bispos e Teólogos — ansiosos por verem sua Igreja fora do Movimento.

A participação Ortodoxa é um fator de importância capital para o Movimento Ecumênico: é principalmente a presença Ortodoxa que protege o Concílio Mundial de Igrejas de parecer simplesmente uma aliança Pan-Protestante e nada mais. Porém o Movimento Ecumênico é importante para a Ortodoxia: ele ajudou a forçar as várias Igrejas Ortodoxas para fora de seu isolamento comparativo, fazendo-as encontrarem-se umas com as outras e a entrarem em contato com Cristãos não-Ortodoxos.

10.8 - Aprendendo uns com os outros

Khomiakov, tentando descrever a atitude Ortodoxa para outros Cristãos, em uma de suas cartas faz uso de uma parábola. Um mestre partiu, deixando seus ensinamentos para seus três discípulos. O mais velho fielmente repetia o que o seu mestre havia ensinado, nada mudando. Dos dois mais novos, um acrescentou ao ensinamento, e o outro retirou parte do ensinamento. Na sua volta o mestre sem estar zangado com ninguém, disse ao mais novo: ‘Agradeça ao seu irmão mais novo; sem ele tu não terias preservado a verdade que eu te passei.’ Então disse ao mais velho:’ Agradeça aos teus irmãos mais novos; sem eles tu não terias entendido a verdade que eu confiei a ti.’

Os Ortodoxos, com toda humildade, vêem-se na posição do irmão mais velho> Eles acreditam que pela graça de Deus eles foram capacitados a preservar a fé não prejudicada,’ nem acrescentando nada, nem tirando nada.’ Eles pleiteiam uma continuidade viva com a antiga igreja, com a Tradição dos Apóstolos e dos Padres, e eles acreditam que num Cristianismo dividido e confuso, é sua obrigação dar testemunho dessa primitiva e imutável Tradição. Hoje em dia no ocidente há muitos, tanto no lado católico quanto no lado protestante, que estão tentando ficar livres da ‘cristalização e fossilização do século dezesseis’, e que desejam ‘ir para trás da Reforma e da Idade Média.’ É precisamente aí que a Ortodoxia pode ajudar. A ortodoxia esteve fora do círculo de idéias no qual os Cristãos ocidentais se moveram nos últimos nove séculos; ela não passou pela revolução Escolástica, nem pelas Reforma e Contra Reforma, mas vive ainda na Tradição mais antiga dos Padres que tantos no ocidente desejam agora recuperar. Esse, é então o papel ecumênico da Ortodoxia: questionar a fórmula aceita do ocidente Latino, da Idade Média e da Reforma.

Além disso, se os Ortodoxos cumprirem esse papel apropriadamente, eles deverão entender sua própria Tradição melhor do que o fizeram no passado; e é o ocidente que pode ajudá-los a fazer isso. Os Ortodoxos devem agradecer aos irmãos mais novos, pois através do contato com Cristãos do ocidente — Católicos Romanos, Anglicanos, Luteranos, Calvinistas, Quakers — eles estão aptos a adquirir uma nova visão da Ortodoxia.

Os dois lados estão justamente começando a se descobrir um ao outro, e cada um tem muito que aprender. Assim como no passado a separação do oriente e ocidente provou ser uma grande tragédia para as duas partes e a causa de um penoso empobrecimento mútuo, hoje em dia a renovação dos contatos entre oriente e ocidente, já esta provando ser uma fonte de mútuo enriquecimento. O ocidente, com seus padrões críticos, e sua escolaridade Bíblica e Patrística, pode capacitar os Ortodoxos a entender o ambiente histórico das Escrituras de novas formas e a ler os padres com crescente acuracía e discriminação. Por sua vez os Ortodoxos podem dar aos Cristãos ocidentais uma renovada consciência do significado interior da Tradição, dando assistência a eles para olharem os Padres como uma realidade viva. (A edição romena da Philokalia mostra quão proficuamente os padrões críticos ocidentais, e a tradicional espiritualidade Ortodoxa podem ser combinadas). Assim como a luta dos Ortodoxos pela recuperação da comunhão freqüente, pode ter um encorajamento pelo exemplo dos Cristãos ocidentais, muitos destes por sua vez viram suas próprias orações e louvação serem incomparavelmente aprofundadas pela familiarização com a arte dos ícones Ortodoxos, a Oração do Coração, e a Liturgia Bizantina. Quando a Igreja Ortodoxa por detrás da Cortina de Ferro puder funcionar mais livremente, talvez as experiências e experimentos ocidentais a ajudarão a manejar os problemas do testemunho Cristão dentro de uma sociedade secularizada e industrial. Enquanto isso a Igreja Ortodoxa perseguida serve como lembrança para o ocidente da importância do martírio, e constitui um testemunho vivo do valor do sofrimento na vida Cristã.




Porque muitos libertários rejeitam o gradualismo e o minarquismo...

Por que Minarquismo e Gradualismo são incompatíveis com o Libertarianismo

Felipe Ojeda

Obs.¹: O presente texto é um resumo do artigo científico que será publicado no portal do Instituto Rothbard. 

Obs.²: A análise a seguir parte das descrições mencionadas acima. Alguns pontos, como “gradualismo” possuem outras descrições popularmente aceitas, porém, o texto a seguir refere-se à definição supra.

Primeiro vamos às definições:

Minarquismo é a teoria política que prega que a função do estado é assegurar os direitos básicos da população, inferindo que as únicas funções do Estado seriam a promoção da segurança pública, da justiça e do poder de polícia, além da criação de legislação necessária para assegurar o cumprimento destas funções.

Gradualismo é a estratégia utilizada por “libertários” para, adentrando à máquina pública, destruí-la por dentro. O nome não se refere a uma extinção gradual do estado, mas de uma gradual exceção à própria ética para realizar agressões sob o argumento de que resultarão em uma extinção do estado, ou seja, de um agressor ainda maior.

Libertarianismo é a defesa da ética libertária, que é um mecanismo lógico-jurídico que veda a iniciação de agressão a indivíduos pacíficos e suas propriedades.

Ética Libertária é o mecanismo de solução de conflitos envolvendo recursos escassos entre dois ou mais agentes. Também pode ser chamada de lei libertária, lei da propriedade privada e ética da propriedade privada.

A Ética Libertária foi derivada à partir de princípios filosóficos e ensinamentos da Escola Austríaca, como a praxeologia. Sem compreender minimamente estes princípios, não é possível compreender a ética.

Talvez por isso Murray Rothbard buscou uma abordagem minimalista com a derivação da ética a partir de um dogma, o princípio da não agressão – PNA ou NAP. O que pode ter se demonstrado eficiente e didático, porém pouco científico, uma vez que o que seria ético ou não seriam conclusões lógicas a partir de um axioma (verdade que não se pode refutar), mas de um dogma (princípio que se presume seja verdade incontestável).

Esta inanição principiológica levou a algumas catástrofes, dentre elas a fundação do instituto cato, em uma aproximação unionista com liberais e a fundação do partido libertário, ambos erros crassos praticados pelo próprio Rothbard, que posteriormente arrependeu-se publicamente. Ou seja, a árvore tinha uma bela folhagem, porém, carecia de uma raiz sólida.

Neste cenário surge Hans-Hermann Hoppe com uma derivação da ética puramente lógica e racional, extraindo o mecanismo diretamente dos axiomas da Ação Humana e da Escassez dos Recursos Naturais, dentre outros. É o que chamamos de Ética Argumentativa Hoppeana.

Há ainda uma série de outras derivações racionais e lógicas, propondo assim modelos de ética, ou seja, lei de propriedade privada. Mas este não é o escopo deste texto.

O que pretendo é frisar que estas derivações da ética são apodíticas, ou seja: cujas premissas e proposições não podem ser falseadas ou refutadas, por resultarem de raciocínio lógico.[1] Se forem refutadas, a lógica será falha.

O modelo ético, depois de proposto, não mais pertence ao seu proponente. Ou seja, se a partir da ética proposta por Hoppe é possível chegar-se à conclusão lógica de que a participação político-partidária configura uma agressão, pouco importa se o próprio proponente, Hoppe, se posiciona de forma contrária a esta conclusão. Assim, são as premissas e o próprio mecanismo que levam à conclusão e não o proponente, caso contrário trataria apenas de um apelo à autoridade.

Também por esta razão é completamente equivocado dizer que o libertarianismo trata-se de uma ideologia ou uma utopia. Muito embora boa parte dos libertários que se tem conhecimento muitas vezes defendam pautas que possam ser consideradas ideológicas e utópicas como a extinção total dos estados, ou um eventual ”ancapistão”, não se tratam de análises do libertarianismo em si mas de apenas projeções realizadas por indivíduos com base na lógica (ética) libertária.

Em essência, o fim do estado é desejável, a criação de um território livre como um ancapistão é extremamente ambicionado, porém, não tratam-se de princípios, mas ideais pautados na moral. 

Isto posto, vamos às premissas que fundamentam esta análise:

  • Não há legitimidade para sobrepor a vontade de um terceiro (um indivíduo A ou uma coletividade) sobre um indivíduo B quanto à sua propriedade, sem que isto configure uma agressão.
  • Não há legitimidade para um terceiro impor-se um parâmetro aceitável de agressão sobre um indivíduo quanto à sua propriedade, sem que isto configure uma agressão.
  • Não se pode repudiar por princípio um ato e lhe defender ao mesmo tempo sem incorrer em uma contradição.

Apesar de uma série de pontos coadunantes entre a moral e principalmente moral econômica, entre minarquismo, gradualismo e libertarianismo, tais posicionamentos incorrem em agressões, portanto, são logicamente incompatíveis com a ética libertária.

Desta forma, resta evidentemente comprovado logicamente que as ideologias: minarquismo e gradualismo, por tratarem-se da defesa de uma limitação à moral estatista mainstream possuem diversos pontos de aproximação com, principalmente, moral e economia libertária. Contudo, enquanto defesas de imposição de determinados graus de agressão, ainda que “menores”, são totalmente incompatíveis com o modelo lógico-jurídico chamado de ética libertária.

[1] Neste caso “não poder” devido à impossibilidade e não uma proibição.

https://universidadelibertaria.com.br/por-que-minarquismo-e-gradualismo-sao-incompativeis-com-o-libertarianismo/?srsltid=AfmBOorKAgp60UziuyfmjGoWljtEHDKnMaNPLE60zE0AasBnRI_X2dmu

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quarta-feira, 10 de dezembro de 2025

AS SEIS LIÇÕES

DO LIVRO

AS SEIS LIÇÕES 

De Ludwig von Mises

Traduzido por Maria Luiza Borges 

7ª Edição 

Pr e f á c i o 

O presente livro reflete plenamente a posição fundamental do autor, que lhe valeu – e ainda lhe vale – a admiração dos discípulos e os insultos dos adversários. Ao mesmo tempo que cada uma das seis lições pode figurar separadamente como um ensaio independente, a harmonia da série proporciona um prazer estético similar ao que se origina da contemplação da arquitetura de um edifício bem concebido. (Fritz Machlup, Princeton, 1979) Em fins de 1958, meu marido foi convidado pelo Dr. Alberto Benegas Lynch para pronunciar uma série de conferências na Argentina, e eu o acompanhei.

Este livro contém a transcrição das pa lavras dirigidas por ele nessas conferências a centenas de estudantes argentinos. Chegamos a Argentina alguns meses depois. Perón fora força do a deixar o país. Ele governara desastrosamente e destruíra por completo as bases econômicas da Argentina. Seu sucessor, Eduardo Leonardi, não foi muito melhor. A nação estava pronta para no vas ideias, e meu marido, igualmente, pronto a fornecê-las. Suas conferências foram proferidas em inglês, no enorme auditório da Universidade de Buenos Aires.


Em duas salas contíguas, estudan tes ouviam com fones de ouvido suas palavras que eram traduzidas simultaneamente para o espanhol. Ludwig von Mises falou sem nenhuma restrição sobre capitalismo, socialismo, intervencionismo, comunismo, fascismo, política econômica e sobre os perigos da ditadura. Aquela gente jovem que o ouvia não sabia muito acerca de liberdade de mercado ou de liberdade individual. Em meu livro My Years with Ludwig von Mises, escrevi, a propósito dessa ocasião: “Se alguém naquela época tivesse ousado atacar o co munismo e o fascismo como fez meu marido, a polícia teria interferi do, prendendo-o imediatamente e a reunião teria sido suspensa.” 

O auditório reagiu como se uma janela tivesse sido aberta e o ar fresco tivesse podido circular pelas salas. Ele falou sem se valer de quaisquer apontamentos. Como sempre, seus pensamentos foram guiados por umas poucas palavras escritas num pedaço de papel. Sabia exatamente o que queria dizer e, empregando termos relati vamente simples, conseguiu comunicar suas ideias a uma audiência pouco familiarizada com sua obra de um modo tal que todos pudes sem compreender precisamente o que estava dizendo. As conferências haviam sido gravadas, as fitas, posteriormente, foram transcritas. Encontrei este manuscrito datilografado entre os escritos póstumos de meu marido. 

Ao ler a transcrição, recordei vividamente o singular entusiasmo com que aqueles argentinos ti nham reagido às palavras de meu marido. E, embora não seja econo mista, achei que essas conferências, pronunciadas para um público leigo na América do Sul, eram de muito mais fácil compreensão que muitos dos escritos mais teóricos de Ludwig von Mises. Pareceu-me que continham tanto material valioso, tantos pensamentos relevan tes para a atualidade e para o futuro, que deviam ser publicados. Meu marido não havia feito uma revisão destas transcrições no intuito de publicá-las em livro. Coube a mim esta tarefa. 

Tive mui to cuidado em manter intacto o significado de cada frase, em nada alterar do conteúdo e em preservar todas as expressões que meu ma rido costumava usar, tão familiares a seus leitores. Minha única contribuição foi reordenar as frases e retirar algumas das expressões próprias da linguagem oral informal. Se minha tentativa de con verter essas conferências num livro foi bem-sucedida, isto se deve apenas ao fato de que, a cada frase, eu ouvia a voz de meu marido, eu o ouvia falar. Ele estava vivo para mim, vivo na clareza com que demonstrava o mal e o perigo do excesso de governo; no modo compreensivo e lúcido como descrevia as diferenças entre ditadura e intervencionismo; na extrema perspicácia com que falava sobre personalidades históricas; na capacidade de fazer reviver tempos passados com umas poucas observações. 



Quero aproveitar esta oportunidade para agradecer ao meu ami go George Koether pelo auxílio que me prestou nesta tarefa. Sua ex Prefácio 11 periência editorial e compreensão das teorias de meu marido foram de grande valia para este livro. Espero que estas conferências sejam lidas não só por especialistas na área, mas também pelos muitos admiradores de meu marido que não são economistas. E espero sinceramente que este livro venha a tornar-se acessível a um público mais jovem, especialmente aos alunos dos cursos secundários e universitários de todo o mundo. 

Margit von Mises,  Nova Iorque Junho, 1979

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